terça-feira, 7 de setembro de 2010

A Menina que Veio Lá de Cima - Capítulo Dois



(Ilustrado gentilmente por Manguinha, visitem o blog dele clicando aqui. O que acharam do Desenho? Comentem ^^)


- Para onde você está indo? - Perguntei, preocupada.

- Não sei, eu só quis estar aqui e cantar com você - disse ela sorrindo.

- Como assim? Você me conhece? Me seguiu? - Eu me senti ridícula fazendo aquelas perguntas a uma garota cega.

- Claro que não. Apenas vi você triste e vim até aqui.

- Você sabe ir pra casa? 


Fez silêncio, cabisbaixa.

- Como você entrou no onibus? Onde estava antes?

- Não me lembro.

- Qual a ultima coisa que se lembra?

- Os fogos de artifício. 

Aquilo não estava ajudando.

- Onde é sua casa?

- Lá em cima.


- Lá em cima?

- É, no céu. Igual o Pequeno Príncipe. 

Quando tentei articular uma pergunta que pudesse trazer alguma lógica à conversa, ela encostou a cabeça no meu ombro, bocejando, olhos fechados, quase dormindo.
Bem, o que eu podia fazer? Era noite e ela não fazia idéia de como voltar para casa. Estávamos chegando no meu bairro, que era perigoso e a milícia não gostava muito de pessoas andando depois das dez. Faltavam vinte minutos. O que eu podia fazer?
Era estranho. Apesar da minha profissão, eu normalmente não me importava assim com as pessoas. Ia ao centro de assistencia social todos os dias, ajudava moradores de rua, aposentados, crianças abandonadas, mães que ainda precisavam aprender a ser filhas, prostitutas, viciados em drogas, alcoolatras. Lidava com essas pessoas o tempo todo, e era apenas meu trabalho. Nunca levaria uma dessas pessoas à minha casa.
Mas lá estava eu sugerindo à esquisitinha a passar a noite comigo. Não me pergunte por que. Talvez porque vê-la ali, tão frágil e doce, aliviou o stresse de alguns meses. Ou por apesar de não me importar muito, meu trabalho exigisse isso. Essas eram desculpas que dei a mim mesma naquela época, porque eu ainda não reconhecia que eu havia me apaixonado pela ruivinha.
Desci com ela e a levei para casa. Ela estava com muito sono, mas me preocupei se estava alimentada. Deus sabia há quanto tempo ela estava perdida. Preparei um achocolatado e um misto quente. Era tudo o que eu comia em casa desde o dia em que saí do hospital.
Ela mal conseguia manter os olhos abertos, mas tinha tanta fome que comeu três mistos e duas canecas de chocolate. Eu ficava toda preocupada em colocar as coisas na mão dela e parece que ela não se incomodava como quando perguntei se ela podia me enxergar. Talvez devido ao sono.
Coloquei-a na minha cama. Não nego, foi uma experiência estranha. Não pense que a imaginei como uma filha ou irmã mais nova. Isso nunca aconteceu. Era estranho cuidar de alguém daquela forma e ter uma criança em casa, na minha cama, mas se ela acordasse procurando pela mãe durante a noite, eu gostaria de estar por perto. Cobri-a, pois estava frio. Ia dormir na cadeira ao lado, mas ela agarrou meu braço, resmungando algo que não entendi. Sem jeito, sentei-me ao seu lado, acariciando sua franja.
Fiquei me perguntando de onde ela veio, o que fazia no ônibus, quem era sua família.
"Assim que ela acordar, procuraremos seus pais. Há tanta coisa que gostaria de saber sobre ela", pensei.
"Ainda nem sei seu nome".
Naquela noite, pela primeira vez em um ano, não tive dificuldades para dormir.

4 comentários:

Anônimo disse...

Que legal, muito bacana ^^

Jequinh4 disse...

O desenho ficou muito massa! Gostei um monte ;D

Anônimo disse...

Você tem que voltar a escrever os seus contos, quero ver o mais do fake-me e a menina que veio lá de cima.

PsychoPris disse...

Desculpa a demora para postar. Eu ando meio desmotivada e sem tempo. São dois problemões de uma vez só. Quando é só um ou outro, a gente da um jeito, né? Mas os dois é complicado rsrs

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