terça-feira, 13 de abril de 2010

Fake Me - Capítulo Um

Posted by: Mari
Date: terça-feira, 13 de abril, 2010
Playing Now: Evanescence - Everybodys Fool (tradução)

Eu tenho uma habilidade especial. Não como em X-Men ou Heroes. É uma habilidade mental que me favorece muito. Eu entendo as pessoas.

Meu nome é Mari. Claro que este não é meu nome verdadeiro. Afinal, eu sou um fake. Criei este blog para escrever sobre minhas experiências e não quero ser identificada. E também não gosto de anonimato. As pessoas não ligam muito de falar com um fake, mas os anônimos sempre são encarados como covardes. Um fake sempre permite mais proximidade, mesmo que saibam que é um fake, só pela aparência de realidade. Uma foto já aumenta a sensação de se estar falando com uma pessoa real.

Imagem é tudo. Dependendo da imagem que você apresenta, você se torna uma pessoa acima de qualquer suspeita, atraente, amiga, sábia, conselheira... e esta sou eu. Prazer em conhece-lo.

Mas não é apenas com imagens que se constrói um bom fake. O fake precisa ser uma pessoa real. Precisa de uma história de vida, de uma personalidade, gostos, preferências, crenças, sentimentos, desejos, vontades, obrigações, deveres, traumas, alegrias, tristezas, sonhos... e, claro, não podem ser os seus, afinal o fake serve pra você se preservar e não ter que falar de si mesmo com ninguém.

Bem, você deve estar imaginando que eu sei muito sobre o assunto. Sim, eu sou uma mestra em fakes. Algumas das minhas melhores amigas e até meu irmão tem meus fakes adicionados e conversam com eles. Eu os uso como teste para cada fake que eu crio. Se eu consigo enganar as pessoas mais próximas a mim, consigo enganar a qualquer um. Até hoje, eles nunca desconfiaram de nenhum dos meus fakes. Pelo contrário, eu soube de coisas através dos fakes que eu nunca saberia de outra forma. O que minhas amigas pensam de mim, de quem elas gostam na escola, pequenos delitos cometidos... Por Deus, eu já levei uma proposta indecorosa do meu próprio irmão! ISSO é traumático!

Criar fakes faz parte da minha vida, e eu até mesmo ganho algum dinheiro de empresas que precisam de alguns deles para publicidade. No entanto, minha especialidade não são fakes de internet. São fakes da vida real.

Pense um pouco. Fakes não são uma novidade que surgiu com as redes sociais da internet. Eles sempre existiram em qualquer tipo de sociedade em que pessoas precisem se sentir aceitas. Sempre houveram pessoas que fingem ser aquilo que não são para ganhar um pouco mais de crédito e atenção. Quem nunca simulou um pouco, fingiu gostar de algo que não gosta, riu de uma piada sem graça? Alguns mais que outros, é claro, mas a verdade é que vivemos em um mundo fake.

Essa é minha habilidade especial. Eu entendo e decodifico as pessoas, suas ações e pensamentos até alcançar a mais oculta motivação. Eu não posso ler mentes, mas sei como o Matt Parkman se sente. É difícil conviver com alguem que voce sabe que está sendo falso com você.

A menos que você tire proveito disso. Eu tirei.

Se sou sincera com alguém? O que você faria se pudesse ser qualquer um, a qualquer momento? ;)

Não me censure. Eu não sou a responsável por isso. Tudo o que o mundo que me cerca me ofereceu foram pessoas falsas. Tudo o que eu fiz foi devolver a falsidade, só que de forma mais sofisticada e competente. Por causa da minha habilidade, isso foi tudo o que pude aprender das pessoas. Qualquer outro ensinamento que tentaram me passar, por mais moralmente correto que fosse, foi obscurecido pelo manto de falsidade e hipocrisia que o acompanhava.

É isso que eu sou. Um dopleganger moderno. Se você me perguntasse quem eu sou de verdade, acho que nem saberia responder ^^

Mas a razão de criar este blog é por causa dele.

No inicio do ano, um aluno foi transferido para minha turma de ética, na faculdade de direito. Vamos chamá-lo de Victor. Ele parecia ser o típico cara anti-social e relaxado. O modo de andar, o modo de ajeitar com as mãos os cabelos escuros e lisos, de falar, de gesticular, escrever, comer, tudo era muito arrogante e, ao mesmo tempo, despretensioso. E, como todos com este perfil, parecia muito falso, um clássico fake escolar do tipo que finge não ter preocupações. No entanto, mesmo sem demonstrar interesse nos estudos, sempre sabia de tudo. Eu senti o perigo da concorrência quando ele entrou na sala e começou a ser cercado por colegas e suas mal-disfarçadas intenções de tirar proveito do novo candidato a aluno do ano. Admito, foi uma sensação inédita de insegurança. Afinal, desde a quinta série, eu sempre fui a primeira da classe e todos os que disputavam comigo logo desistiam e se tornavam meus amigos e bajuladores. Eu sempre fui alguém agradável – ou ameaçadora, dependendo da situação – a ponto de ninguém desejar se tornar um rival por muito tempo.

Mas dessa vez foi diferente. Eu pude ver, através da forma como Victor se sentava displicente, escrevendo sem olhar para o professor durante a explicação, que ele não precisava se concentrar nos estudos para aprender. Não que ele já soubesse a matéria; isso eu pude perceber. Ele era do tipo capaz de fazer três coisas ao mesmo tempo sem nenhum esforço. Observando o modo como ele explicava aos que tinham dúvidas após as aulas, notei que Victor possuía uma incrível habilidade de compreender a dificuldade dos outros. Sua explicação era tão simples e esclarecedora que nos fazia preferir ele ao professor. Seus olhares eram sempre despretensiosos e, muitas vezes, vagos e distantes, sem expressar nenhum desejo ou objetivo. Enquanto era cercado pelos colegas de classe, tinha sempre o queixo apoiado na mão fechada, os pés e joelhos voltados para a porta. O tom de voz era sempre baixo e sem muita emoção. Foi isso que começou a me intrigar.

Apesar da popularidade na turma de ética, durante vários dias, nos intervalos, eu o via sozinho fumando debaixo da única árvore que existe atrás da quadra de futebol. Por que ele não aproveitava sua aceitação para ganhar a lealdade de todos? Eu me senti perturbada e cada vez mais confusa. Alguma coisa naquele rapaz não estava certa, alguma coisa era muito fora do normal. E para tornar meu incômodo ainda mais intenso, ele olhava para mim de um modo que ninguém nunca jamais olhou antes. Quero dizer, as pessoas normalmente não me olham nos olhos, nem me observam, porque eu me imponho sobre elas e as intimido. Mas ele, ao passar os olhos nos meus, ainda que de relance, parecia me decifrar, quase da mesma forma que decifro os outros. De repente, me senti indefesa, nua, exposta.

E o pior era ele me olhar sempre com indiferença, pelo canto dos olhos, como se eu fosse uma existência a ser ignorada. Eu era uma presa fácil. Não, eu era apenas um objeto na paisagem, sem nenhuma importância. Pela primeira vez, eu era desprezada.

Eu chorei lágrimas de ódio por isso.

Então eu percebi o que ele tinha de tão diferente: ele, em todas as suas ações, falas e gestos, era total e completamente sincero e sem intenções ocultas. Não havia sequer um traço de falsidade ou mentira, nada que estivesse ocultando ou dissimulando. Não possuía nenhum plano de conquistar a amizade ou lealdade de alguém em troca de sua ajuda. Ele era simplesmente aquilo que víamos, nada além.

Ele era uma abominação. E desafiava minha existência!

Era pior do que a concorrência que eu temi no início. Não era meu status que estava em risco. Era minha própria razão de viver do modo que vivo que estava ameaçada. Percebi que enquanto alguém como ele existir, a vida que construí não fará sentido. Afinal, eu construí toda a minha vida baseando-me no fato de que não existe honestidade no mundo. Ele contrariava essa minha convicção. Já é tarde demais para eu mudar, mesmo se eu quisesse, então decidi que, para continuar sendo quem eu sou, preciso fazer com que ele deixe de ser quem é.

E foi aí que a minha vida começou a desmoronar.

Fim do primeiro capítulo.


Próximo capítulo >>

8 comentários:

Lorde Velho disse...

Promissor... beeeem promissor...
;)

Unknown disse...

Muito doido.

Quando sai o próximo? >...<

Anderson disse...

Vi no twitter que vc pediu feedback, então lá vai:
Achei o ritmo muito quebrado até a metade do texto. Faltou coesão.
Apartir momento em que passa a ser mais descritivo que dissertativo as coisas melhoram consideravelmente e a história fica bastante promissora.
Resta saber o rumo que ela vai tomar agora...

Dug disse...

Nossa ótimo... Adorei. Pronta pra ser filósofa.
Gostei tanto que passei o blog para alguns amigos. Radical.

Blackassia disse...

Eu gostei,mas quanto a parte do dissertativo e descritivo concordo com Anderson.Bjs Pri

PsychoPris disse...

Que bom que gostaram :)

Anderson e Blackassia, obrigada pela dica. Eu senti que algo estava errado no ritmo, mas não tinha percebido que era isso. Vou ficar mais atenta :)

Lucas Hikaru disse...

....
wooow...
Shows! gostei mto ^^
praticamente mergulhei na história rsrs
estarei esperando o próximo capítulo! XD

PsychoPris disse...

Dug, Filosofa, eu? Nossa, me surpreendeu agora rsrs. Acho que filosofia é um pouco complicado pra mim por enquanto ^^

Postar um comentário